sexta-feira, 20 de julho de 2012

O jornaleiro


Lá para as bandas da minha infância, num
tempo muito distante dos dias de hoje, me
ouço gritando:
- Olha o jornaleiro...! Enquanto 
caminhava às ruas poeirentas da cidade 
satélite do Gama.

Que ironia! 
Em minha inocência eu não me dava 
conta do quão cómico era eu, um 
analfabeto, me esforçando para vender 
jornais a viventes semianalfabetos.

Naquela tempo, a cidade do Gama era u
universo de operários rudes, pessoas 
sofridas onde poucos tinham o suficiente 
para o pão de cada dia e, eu, em minha 
ignorância, insistia querer vender-lhes 
jornal gritando: - Olha o jornaleiro!

Enfurecido, o vento soprava, obrigando a
poeira vermelha, das ruas sem pavimento,
a se levantar do chão.
Resmungando, a poeira, enfurecida, se 
levantava e atirava-se em meus olhos que,
ardendo, choravam.  

Cego, com os olhos cheios de poeira, e
não percebia a ironia dos meus gritos e 
seguia gritando: - Olha o jornaleiro...
Tolo, não me dava conta do que 
pensavam os passantes, gente rude que, 
em sua ignorância, se perguntavam:
- Quem precisa ler jornais?
 
Quanta ignorância, vender jornal para 
gente que mal sabia assinar o nome?
Gente que, em sua maioria, mal tinha o
suficiente para o pão de cada dia.
Bem! 
Eu, também, vivia a minha ignorância.

Sendo ridículo, eu enchia o peito 
liberava o meu grito: - Olha o jornaleiro! 
Hoje, rememorando aqueles tempos,
os meus grito soam muito mais como
ofensas àqueles viventes, do que como
oferta de serviço.
 
O vento arrastou para distante os meus 
grito, ele os levou para tão longe que,
hoje, eles chegam aos meus ouvidos e
gritam: - Olha o jornaleiro...!
Eles gritam, ainda hoje gritam em meus 
ouvidos, em meio aos meus pesadelos.

       O Mensageiro - Brasília, julho de 2012.

                    *

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